sexta-feira, 14 de abril de 2017

Certame






Certame

Fracasso no começo, fracassei.
Um passo para frente, fracassado.
Permito-me insucessos porque sei
que todo o meu porvir é bem passado.

Um caso recorrente, não cansei
das graças do malogro começado.
Sentindo-me seguro, baguncei:
Tem êxito o fracasso, desgraçado!

É tanto maneirismo não maneiro,
é nó de marinheiro no cordame,
emaranhado coração. Que dor.

Entanto vou adiante, em rotineiro
caminho para cima do tatame...
Meu lugar no certame? Perdedor.

***
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6 comentários:

BAR DO BARDO disse...

Gostei da menção ao rap. Gostei mesmo. Grato, Marcos!

tudoporfazer disse...

JS ataca novamente.
Bom poema este, um poema pessimista mas honesto. Ao contrário do poema The Road Not Taken, de Robert Frost, onde "maybe the speaker isn't being quite honest", no dizer do saite dunidense shmoop.
Apareceu esse poema no saite do Suttana, por intermédio de um leitor dele. O poema, que já é incompreensível no formato poético , foi apresentado inicialmente num formato pop, com letras de diferentes formatos e tamanhos, sem pontuação. Um altar para algo digno daquilo que o gato enterra.Li o poema, e não entendi nada, ou quase nada. Procurei traduções, e achei quatro. Fiz um comentário respeitoso, admitindo que o poema era muito difícil de interpretar, não apenas para mim, como brasileiro (e orgulhoso de o ser), mas para os próprios conterrãneos do poeta. Ousei traduzir o verso oitavo, um verdadeiro desastre (mas não maior do que o dos outros tradutores). Pois não é que o poema em forma pop foi, de repente, excluido do mundo digital, e com ele o meu comentário apressado?
Pois fiz outro comentário, em outro local, no saite entreculturas. E desta vez, com maior background. Esse poema, embora negue seu verniz modernista (movimento de cem anos atrás), é inequivocamente modernista no seu nihilismo perplexo (próprio dos anos da Grande Guerra e posteriores). E Robert Frost (posso estar enganado, e admitirei se isto se provar) foi um precursor do ultra-nihilista Manoel de Barros (note que ambos tem origem rural).
Cultura é entrechoque de ideias. E sem entrechoque de ideias (com sua posterior e inevitável harmonização, já que armas nucleares ou convencionais não eliminam um dos conflitantes culturais) não há cultura. Assim, denuncio a censura do pensamento, no Brasil pretensamente Culto e Humanista (que se contrapõe ao Brasil decoreba dos concurseiros dos serviços públicos relacionados à pretensa "Justiça" que quer enquadrar Lula num script pré-aprovado pelos "donos do Mundo"). Mais triste que o seu (o teu, Pimenta) poema...

BAR DO BARDO disse...

Interessante sua tese de que niilismo, por vezes (pelo menos) pode ser produto do choque cultural de um caipira sendo "corrompido" pela cidade grande, JS. Nunca havia pensado nisso. Eu, p.ex., estou mais para caipira e, sinceramente, tenho pânico das metrópoles. [A propósito, o Renato é um intelectual e poeta e tradutor com "sustança" - e Suttana.] Abraço, Jarbas.

tudoporfazer disse...

E eu, mais caipira ainda. A postagem pretensamente desaparecida ainda está lá, para minha humilhação (por estar lá e pelo conteudo furado da tentativa de tradução). É que comentei, lá, pelo meu heterônimo Valdir. Peço desculpas ao Suttana e a você.

O tal nihilismo (e a tese não é minha) vem da ruptura do progresso aparentemente harmonioso e infindável do fin de siécle e inícios do século XX. O mundo caiu de repente para o racionalismo e a "superioridade" dos intelectuais do Velho Mundo. MB teria sido tragado por uma sub-onda tardia.

Quanto ao Suttana, ótimo poeta dos temas políticos atuais. Me encantou a sua referência a uma personagem que trai pai e mãe "por uma asa de mosquito". Mas aparentemente o Renato acha, como quase todos os poetas atuais, que ser compreensível não é literário (quando muito, "agitação cultural"), e aí envereda também pelo non-sense (que é tido como surrealismo, para movimento tumular de André Breton), achando que, suprimindo ou deslocando conexões, está acrescentando sentidos ao enunciado. Por esse enfoque, as charadas seriam produções literárias!...

tudoporfazer disse...

Sobre a hermética e árida (e fácil de perpretar) poesia contemporânea, descobri que não estou sozinho na minha crítica a quem faz "poesia", não para comunicar ideias e sentimentos, mas para "impressionar" gente impressionável (o que inclui uma legião de acadêmicos). Vejo que George Steiner tem a mesmíssima opinião:

O poeta moderno utiliza as palavras como notação particular, cujo acesso é dificultado cada vez mais ao leitor comum. Onde há trabalho de mestre, onde a privacidade dos meios é instrumento de uma percepção intensificada e não simples artifício, ao leitor se exigirá o necessário esforço. Mesmo antes de se compreender a visão de Rimbaud ou a excêntrica estrutura argumentativa das Elegias de Duino, tem-se consciência de que Rimbaud e Rilke estão usando a linguagem de novas maneiras a fim de passarem do real para o mais real. Nas mãos de talentos menores ou de impostores, contudo, a tentativa de renovar a linguagem reduz-se a aridez e obscuridade. Dylan Thomas é um exemplo disso. Ele percebeu, com a habilidade de um showman, que um grande público não-qualificado se sentiria lisonjeado se lhe dessem o acesso a uma poesia de aparente profundidade. Combinou uma loquacidade retórica à la Swinburne com expedientes cabalísticos de sintaxe e figuras de estilo. Demonstrou que era possível "ficar com o bolo órfico" e também "comê-lo". Mas, fora algumas expressivas exceções, em seus poemas há menos do que os olhos ofuscados vêem.

George Steiner, Linguagem e Silêncio, pág. 47.

BAR DO BARDO disse...

Steiner é capaz de ter razão e detê-la. Mas eu uso o soneto muitas vezes como exercício maneirista e, portanto, estético. Quando isso ocorre, não há sentido, ideia, mensagem. Há apenas arte.