segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Do corpo

 
Le nu provençal - W. Ronis


À paz do corpo

O que se pacifica na rotina,
No gelo do silêncio percutido,
Na louça pela pia, na cortina
Da sala, que é puída, no ruído

De insetos voadores à retina,
No chão que é por varrer, ou que é varrido,
No longe decadente que domina
Seus atos, perdição do que é perdido,

Tambor de marcação ao que se jaz,
Se busca nas galés, internamente,
O que se pacifica não é paz.

Tambor de coração até compor
O corpo que não teme o vão temente,
No meio da rotina a seu dispor.


Dádiva

Incorporo o teu corpo como posso,
Um osso com carninha de pescoço,
Um poço de fissura em cada poro.
Agrado-me de ti, de tua soma.

Eu ponho o teu no meu para ser nosso.
Componho-me de entranhas e de fosso,
Entalho os teus detalhes, passifloro,
E, grave, o teu espírito me assoma.

A frente é mais além,  feito uma estrela.
O dorso para mim, em asas, doce.
O dois que se faz um, de uma costela.

Escarro do meu sangue, a tua tosse...
Dispneica, já sem pulso, desatrela...
Incorporo o teu corpo como posse.


***
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