terça-feira, 31 de março de 2009

Do mar indomável

Illustration by Arlene Graston



Vivi alguns anos em Natal, Rio Grande do Norte. Primeira vez que sorvi algumas gotas da água do mar e falei o óbvio "é salgada!". Meus pais e irmãos mais velhos se riram. Morei lá, durante um tempo, no bairro de Ponta Negra, bem próximo da praia de mesmo nome. Eu era um adolescente e o mar me deixava feliz...
Hoje estou bastante longe, materialmente, do mar. Hoje percebo, porém, que a experiência marinha está dentro de mim.
Tentei traduzir isso, embora intraduzível por meio de palavras.




O verso


O mar fez um convite e lacrimeja,
Desejo que me aceite domicílio
Por sempre, por eterno, por que veja
Dos ângulos profundos, como um filho

De fôlego sem fim. Bendito seja,
Salobro como sêmen, o concílio
Da vida que celebra e que viceja
Na sopa d'oceanos de fervilho.

Concorda-se em solícito o convite,
Desdobra-se em mercês ao litoral,
Não há que se recuse e que se evite

Nem mesmo os abissais em água e sal,
As trevas penetrantes de rebites
E espetos, pelo verso universal.



Gota serena

Mergulha ao mar de agulhas, roseiral,
Engulhos, mais agruras, com vontade
De morte, que nem tenta passional
Um crime contra a atenta potestade,

Netuno, O Rei dos Verdes. Abissal,
Em água, medo e sal, toda a verdade
Da vida se esvaindo pelo mal,
No sangue que, tingido a tom de jade,

Atinge a identidade do verdugo.
Transforma-se na gota em que o poeta
Distingue-se, indistinta de seu bem.

Se mar, ou maresia, não há jugo,
Cativa que se livra pela meta
De ser mais uma gota, pois, amém!

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